Cenas literárias. Textos cenográficos. Relações improváveis entre futebol e culturas inúteis. Ou mera imaginação.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

O Maracanaço africano



Existe um deus do futebol e dizem que ele é bipolar. Ao mesmo tempo, pode ser generoso ou mesquinho, sorridente ou ranzinza, tolerante ou impaciente, cria e destrói sonhos, dá tudo pra uns e tira tudo de outros, de forma honesta ou não. O fato é que ele sabe fazer quase tudo, menos justiça.

Se esse deus maniqueísta soubesse o quanto suas decisões atingem a alma dos torcedores, sentiria na consciência a mesma dor que sofrem os corações onde pisa.

O que uma bola na trave pode fazer? E se a África do Sul tivesse ganhado o jogo de estréia? E se o sorteio da FIFA tivesse sido menos rigoroso com os anfitriões? O país que renasceu há menos de uma semana, caiu no grupo da morte. Coisas desse deus do futebol.

O que se sabe é que a esperança de ver os donos da casa na segunda fase acabou. Um país que se enxergou feliz, finalmente. Pessoas que se orgulharam, escancaradamente. Uma nação realizada, sorridente. Merecia mais justiça divina.

A essa hora, a alma dos sul-africanos está aprisionada na num garrafa, sem ar, sem som, sem saída. E vai ver a Copa do Mundo pelo vidro.

A felicidade é apenas a segunda emoção do futebol. A primeira é a dor. Futebol dói. E na paixão pela bola, a lágrima da dor é muito mais salgada do que a da alegria.

Hoje, o Uruguai, espcialista em calar estádios, fez com os africanos o que fez com o Brasil. Em 1950, sangrou um país. Dessa vez, foi um continente.

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Em tempo: Parreira disputou a copa por 4 seleções além da brasileira: Kwait, Arábia Saudita, Emirados Árabes e África do Sul. Nunca ganhou uma partida com essas seleções durante as copas que disputou. Será que o Joel Santana teria escrito outra história?

(foto: fifa.com)

Esse pode jogar no meu time


Diego Forlan, meia do Uruguai, jogou sério e participou muito. Na hora H, soube como fazer. Experiente e excelente líder em campo. Um cara que merece uma camisa 10. Dois gols e um show.

Fim da primeira rodada


O pior já passou (espero). A primeira rodada em qualquer copa sempre fica abaixo das expectativas.

O saldo até agora foi de jogos mornos. Não houve nenhum brilhantismo, nenhum craque, nenhum golaço, nenhuma polêmica. Por exemplo, a média de gols é a pior de todos os tempos: 1,56 por partida. Até agora, a arbitragem não atrapalhou nada.

O que traz esperança de jogos melhores é o fato de que muitas seleções já começam a decidir sua presença nas oitavas a partir de hoje. Quem perdeu, tem que se virar. Quem empatou, precisa ganhar. Quem ganhou, não pode dar chance para os adversários equilibrarem a pontuação. Isso fará os jogos serem mais objetivos e disputados.

No palpite do bolão, é possível dizer que 3 seleções mostraram que podem chegar a final: Alemanha, Argentina e Brasil (nessa ordem). As outras ainda são incógnitas. Até agora, alguns jogadores se candidataram a heróis nacionais: Messi (que pode carregar o titulo nas costas), Klose (se bater o recorde dos 15 gols) e Robinho (que amadureceu muito e chama a responsabilidade para si).

A organização da Copa da África tem sido elogiada e não houve nenhum incidente importante até agora. O temor da FIFA com relação à baixa venda de ingressos não se confirmou e todos os jogos tiveram bom público. A segurança também não foi severamente testada e o atentado terrorista no jogo EUA x Inglaterra não aconteceu. O único incidente foi a expulsão de 25 holandesas do estádio. Elas foram acusadas de publicidade irregular. Parece que estavam vestidas com roupas que estampavam sutilmente a marca da Heinekein. Posso imaginar que deveriam ser tão gostosas quanto a cerveja.

As vuvuzelas já começaram a sofrer restrições. Já era esperado, Ninguém agüenta aquilo.

(foto: fifa.com)

O Maradona de ontem, de hoje e de amanhã

Dieguito voltou a dar suas cacetadas. O orgulhoso e falastrão treinador deu uma entrevista coletiva hoje e quando foi perguntado sobre as declarações que Pelé havia dado sobre as atuações das seleções favoritas, soltou essa tolice:

- Não ligo para o Pelé. Por mim, que ele vá para o museu.

Maradona, imbecil, o Pelé já está no museu! Na memória! Na história!

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Em tempo: Tenho observado o Maradona, o primeiro personagem interessante dessa copa. Ele polemiza sempre que pode, sabe se comportar diante da pressão, protege os jogadores chamando a atenção pra ele e tem citado o Pelé uma vez por semana. Quer se promover lançando provocações com o nome do Rei. E a imprensa engole a isca.

Ele está por cima, sem dúvida.

Mas sobre os duelitos com Pelé, vejo que a inveja do Maradona tem um tanto de admiração. Subconsciente. Em quem o segundo pode mirar? Somente no primeiro.

E tem mais: se o Maradona for campeão mundial, ele vai ser presidente da Argentina um dia, não tenham dúvidas.

Lembrando Armando

Uma vez, o Santos estava excursionando pela África. Jogava de dois em dois dias. Verdadeiros ciganos do futebol. A rotina era sempre a mesma: O Santos chegava à cidade no dia da partida, jogava e, no estádio mesmo, recebia o dinheiro. Pegava o avião e ia vender seu peixe em outra freguesia.

Um dia, o Santos joga em Marrocos. Na hora de receber o dinheiro, o empresário comunica: o cachê não está aqui. O rei Hassan mandou dizer que o dinheiro está com ele e que só entrega se o Pelé for buscar, pessoalmente. Pelé entrou no carro, foi ao palácio deu autógrafos à família real, tirou fotos com o rei e saiu com a erva do Santos num envelope com o emblema real bordado em fios de ouro.

(Pelé e o Tempo, texto de Armando Nogueira)

60 anos do Maracanã


Hoje, o maior do mundo faz aniversário. Vale lembrar algumas histórias.

O nome do estádio é Mário Filho. O homenageado era irmão do escritor Nelson Rodrigues e foi o responsável pelo crescimento e pela importância do futebol carioca na década de 40. Até então, o esporte bretão era coisa da ralé, jogo de periferia. Como diretor
do Jornal dos Sports, criou um clima diferente para falar do assunto. Deu no que deu.

O Maracanã foi construído especialmente para a copa de 1950. Agora, está sendo reformado para uma nova copa. Vai ficar um brinco e será palco de tantas outras histórias, como o Maracanaço. No dia em que superaríamos nosso “complexo de vira-latas”, tinha um Barbosa no meio do caminho. Disse Nelson Rodrigues que o Brasil perdeu na véspera, criticando o clima já-ganhou que tomava o país. Foi um terremoto avassalador na alma brasileira.

Uma vez, durante a inspeção da FIFA nos estádios brasileiros, o Maracanã foi visitado. Quando a comitiva chegou ao gramado, um gaiato jogou uma bola no campo. Os grã-finos de ternos importados não tiveram dúvida: tiraram os paletós e começaram a bater pênaltis uns nos outros. Perderam a compostura completamente. Pareciam crianças, rindo, brincando, rolando no chão. Quem não tem vontade de estufar as redes daquele templo sagrado?

O milésimo gol de Pelé foi no Maracanã, contra o Vasco. Conta a história que entre o gol 999 e o 1000, o Rei jogou três partidas, uma delas no nordeste. Dizem que o prefeito ofereceu uma bolada para que o gol saísse em sua cidade. Seria a fama instantânea e eterna. Mas para o bem do futebol, o Maraca recebeu o gol que fez o Rei virar deus. Melhor que isso, só se fosse no Vaticano.

Falando nisso, em 1980, o Papa João Paulo II começou sua peregrinação pelo mundo e colocou o Brasil na turnê. Dizem que na hora de escolher o lugar da missa campal, ele “pediu” para celebrar a missa do Rio de Janeiro no Maracanã. Publico pagante: 160 mil.

Segue o link com fotos históricas.


http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/fotos/2010/06/veja-fotos-da-historia-do-maracana.html

Um castigo merecido


Já estava na hora de uma zebra invadir as savanas sul-africanas.

A Suíça possui uma das defesas mais compactas da copa. Não é exatamente retranca, é tática. Não é todo mundo cercando a bola, é posição de parede.

A Espanha foi excessivamente caprichosa, querendo fazer gols de placa. Perdeu muitas chances de matar o jogo por causa dessa arrogância. Parece que a cigana que leu as mãos dos jogadores falou que eles são craques como os brasileiros. Bom, ela tomou o dinheiro deles. Bem-feito.

Agora, a Espanha que era candidatíssima a ser a primeira da chave pode ficar em segundo. Se isso acontecer, nas oitavas-de-final enfrenta o Brasil.

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Em tempo: A Espanha perdeu jogando muito mais do que a maioria dos times que venceram seus jogos de estréia. Se eles descerem do salto alto, podem ser perigosos.

Magro, mas convincente


O resultado não reflete o que o jogo foi. O Chile jogou muito bem. Atuou muito pelos lados do campo, envolveu a defesa com facilidade e mostrou bom posicionamento. Um desempenho diferente do que vimos nas eliminatórias.

Um time consistente e maduro. Foi a melhor atuação das seleções sul-americanas até agora.

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Em tempo: Mais uma vez me pergunto como algumas seleções estão na copa. Honduras não tem time nem pra disputar a segunda divisão do campeonato do Piauí.

Todo mundo sabe como o Brasil joga


A Coréia do Norte é um país fechado, Mas aquela defesa...

O resultado deu pra conta do chá e o empate entre Costa do Marfim e Portugal facilita muito a vida da seleção brasileira. Eles terão que vir pra cima do Brasil, aí...

Tirando da conta os atenuantes da estréia, o Brasil foi o que esperávamos: paciente, sábio e sistemático. Nem sempre eficiente, mas dominador do jogo, sem dúvidas. Ninguém jogou “bem demais” porque nem foi preciso. O Julio Cesar tomou aquele gol porque estava congelado. Ficou 80 minutos sem pegar na bola, sob o frio de 2 graus.

E o jogo vai ser assim. Não há nenhuma surpresa, nem agora, nem à vista.

Até o final da copa.

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Em tempo: intrigante aquele choro compulsivo do atacante Jong Tae-Se (9) durante a execução do hino. Soube que ele nasceu no Japão e é filho de sul-coreanos. Na juventude, aproximou-se de movimentos políticos ligados ao comunismo norte-coreano. Nessa mistura de filosofias orientais, ele se naturalizou. E aquele choro mostra como é o sentimento de alguém que pisa no gramado de uma Copa do Mundo pela primeira vez. A emoção deve ser realmente incontrolável.

De volta às navegações


Em outras épocas, Portugal se lançava em direção à África para explorar os nativos. Diga-se de passagem, os lusitanos já fizeram coisas do arco-da-velha no continente africano.

Dessa vez foi diferente. Os elefantes, que em já foram facilmente abatidos pelos bacamartes de Alentejo, bateram o pé e não se renderam. Nem mesmo o bom atirador Cristiano Ronaldo acertou os disparos. Os bacalhaus também não se abateram, apesar de baterem cabeça (sem trocadilhos) para segurar o perigoso Drogba.

Claramente, as defesas venceram os ataques. Aliás essa é uma característica comum aos jogos que temos assistido nessa primeira rodada. Essas duas seleções vão disputar a segunda vaga no grupo e o resultado contra o Brasil e o saldo de gols contra a Coréia do Norte vão decidir.

A partida foi realizada na cidade de Porto Elisabeth, banhada pelo Oceano Índico. A essa hora, os portugas já voltaram para o navio, com as mãos abanando. E os elefantes voltaram para a floresta, com os marfins no lugar.

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Em tempo: o jogador-pop-star Cristiano Ronaldo consegue enganar bem. Todo mundo fala de seu talento. Não acho ele nem candidato a craque, quanto mais digno de uma chuteira de ouro da FIFA. Pela seleção portuguesa, o gajo não marca há mais de dois anos.

Atrasado na lua de mel


Um assunto paralelo ao jogo:

O camisa 10 da Nova Zelândia Chris Killen casou-se dias antes da apresentação da seleção. Fez um acordo com a comissão técnica e deixou a lua de mel para depois da copa.

Lembrei-me de uma história antiga, uma dessas lendas do futebol.

Dizem que no final da década de 70, o Bangu estava prestes a disputar a final da Taça Guanabara. Um feito memorável. O time tinha o artilheiro do campeonato, chamado Ademar (ou Adhemar). Por uma coincidência, Ademar se casaria no sábado anterior à partida. O presidente do Clube, Castor de Andrade, conversou com o jogador e pediu para que ele saísse do casamento direto para a concentração e viajasse para a lua de mel no domingo à noite. Ele topou.

Essa história saiu na imprensa e o Flamengo, adversário da final, também soube do episódio.

Logo no começo do jogo, o zagueiro que marcava Ademar começou a provocá-lo. Dizem que por volta dos cinco minutos de jogo, ele buzinou no ouvido do artilheiro:

- Ademar, é verdade que você casou e não teve lua de mel?

Ademar não respondeu, mas se irritou.

- Você ainda não comeu sua mulher?

Ademar se irritou ainda mais.

- Ademar, posso te garantir. Quando você comer ela, vai gostar. Ela é boa de cama pra caramba.

Ademar não agüentou. Correu atrás do zagueiro e mandou um cruzado de direita na cara do desaforado. Foi expulso aos cinco minutos de jogo.

O Bangu perdeu e Ademar nem ficou no estádio. Saiu de campo direto para conferir a informação sobre a performance de sua esposa.

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Em tempo: Foi-se o tempo em que times como a Nova Zelândia eram saco de pancadas. Até a Austrália metia 5 nesse timeco.